terça-feira, 1 de janeiro de 2008

A terra dos cães kamikases

Cães na Segunda Guerra Mundial


Era uma terra sem cães nem donos. Era um lugar onde as leis não eram leis, eram como agulhas que furavam, que sangravam, que solviam gotas densas de amargor. Não havia absinto nem vinho doce, não havia cólera ou compaixão. Não era uma terra, não havia lugar, havia sim um nada, uma imensidão interminável de um interminável vazio.

Era uma terra suicida. Uma terra onde todos morriam por si e ninguém morria por ninguém. Era uma terra onde os cães não latiam, onde todos eram cães, todos eram kamikazes. Não havia dor, não havia lágrimas, não havia rancor, nem alegria, nem compaixão, nem melancolia, não havia terra. Nada havia, apenas o nada em meio ao tudo. Havia somente os cães, nem mesmo os cães havia, apenas kamikazes ao léu, apenas herdeiros da sua própria sorte e morte.

Naquela porção latente de vida, éramos herdeiros de nossa mera insignificância e ardor. Éramos apenas o mocinho do filme que nunca se repetiu, mas que sempre nos induz à insônia. Éramos como aqueles cães kamikazes, onde o preço de nossa vida vale mais do que a nós mesmos. Suicidas incondicionais ininterruptos de um eu caótico, insano e lúdico. Naquela terra onde os cães não eram cães, e nós não éramos nós, restávamos apenas nós. Apenas nós, os cães e o infinito, imaginário da própria sorte, kamikazes de nosso próprio destino. No final de tudo, nada havia.

Os cães caminhavam densamente pelas ruas de seu mundo, mundo que não havia, que ressoava vida com cheiro de morte, sabor suicida de lucidez e caos. Mas não havia cães, havia apenas nós, mas onde estamos nós? E os cães, onde se escondem?

Henrique Magalhães
(todos os direitos reservados)

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